Acho

A chuva batendo no teto
Escapando de nuvens rasgadas
Que mostram o entardecer
Através das roturas ardentes
Estou em casa
Minhas irmãs falam alto e brincam
Minha sobrinha prepara um jogo
Minha mãe apresta o jantar
Estou em casa
E sinto a paz
Como se tivesse
Voltado da guerra.

A chuva canta
Canções de ninar
E sinto a alegria
De estar com a família
Que é das alegrias
A mais preciosa.
É como se voltasse
Da travessia do mundo
É como se voltasse
De desertos distantes
Egresso das agruras
Da carne e da alma
Estou em casa e a salvo
Tudo agora é passado
No colo de minha mãe
Eu pranteio a jornada
Vazia da vida
Distante do lar
Estou em casa. Estou em casa
E posso chorar
Acho que não consigo
Acho
Que não
Consigo

Não.

Acho que estou feito um mundo
Redondo geóide plano
Justo injusto cruel amantíssimo
Preso num mundo em tudo igual
Apenas maior. Muito maior.

Acho que não consigo
E quando consigo sofro
E quando sofro quase morro
De ser como quem não liga
Não tenta compreender.

Meu compromisso com a verdade
Não ignora a possibilidade
De eu não saber a verdade.

Acho que não consigo
Ser o macho alfa.
Nem a versão beta.

Acho que não consigo
Ver pela perspectiva do economês
Nem me botar no lugar do outro
Nem deixar na mão de Deus
Nem perguntar para Jesus

É tanta opção furada
E verdade vendida
Que prefiro a abstenção
(Não há mais espaço para a tolerância).

No beco da impossibilidade
Uma frase na parede me alerta
Que não há retrocesso ou avanço.

Acho que não consigo mesmo
Continuar nessa farsa
Acho que não consigo
Mais negar meu interior.

Acho que fracassei
Me perdoe por isso
por não sentir a derrota
Por não me sentir no dever
Por ignorar o prazer
E na mesma medida a dor

Claudinei Soares

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