Eu entrei, me dirigi a pia, deixei a necessaire em um canto. A olhei pelo reflexo, com ar desconfiado. Ela lavava o rosto com tanta força, que me dava a sensação de estar tentando arrancar pela pele, tudo aquilo que lhe valiam as inúmeras lágrimas.
Fui ao banheiro em silêncio, como se não quisesse que meus pensamentos atrapalhassem a dor dela.
Retornei ao espelho, e enquanto lavava as mãos, ainda acompanhava o processo- ou tentativa – de melhora e recomposição daquela jovem. Ela estava brava com aquela lágrima que insistia em rolar, pesada, tão pesada quanto a barra que ela devia estar segurando. Ela era forte, dá pra saber quando não  quer entregar-se. É um choro doloso, contrariado, contraído,  constantemente sabotado. Eu sentia cada segundo mais, que ela não podia sentir tudo aquilo. Mas não fazia sentido. Estava ali, estava aberto, estava doendo e doendo muito. Os suspiros silenciados eram ensurdecedores, as mangas molhadas gelavam-me por dentro. Havia ali, na minha frente, alguém com dor, alguém sozinho, alguém cansado, alguém corajoso, alguém... Era alguém. As  pessoas entravam e saiam como se nada estivesse acontecendo, como quando pulam um mendigo na rua, aumentam o som para não ouvir uma briga, desviam o olhar ao deparar-se  com alguma anomalia, enfim... Era alguém, invisível como um ninguém, incomodando por sua dor e pela total incapacidade das pessoas de não fazerem nada.
Um abraço. Um copo d’água. Um olhar direto. Uma pergunta... Nada.
É mais fácil não ver, é mais fácil abstrair, é mais fácil não se envolver.
E mais vazio também.
Cheguei bem perto daquela moça e disse cuidadosamente: “Você está bem?”
Ela recolheu rapidamente suas coisas espalhadas e disse em tom seco: “Estou ótima. Obrigada!”. Saiu sem – me – olhar para trás.
Vick Vital

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