Marias

Era uma dessas Marias qualquer.
Descia ladeiras carregando peso, calçando chinelos de dedo e no sangue a força de sobreviver.
Viúva e com uma filha mãe solteira de seu único neto, passava o dia a limpar casas e a trazer roupas de suas clientes para sua filha lavar e passar em casa.
A vida nunca suavisou o caminho de Maria.
Vira seu marido morrer ao lado de seu filho em um acidente de carro. Ele bebia e era o único a dirigir na família. O carro era velho demais para evitar o pior.
Mas a tal Maria levantava-se sempre, afinal, tinha sempre quem precisasse dela.
A mão se estendia já quase como obrigação. A vizinhança e os reparos nas roupas das crianças que Maria que, sem coragem de cobrar e sem sorte de receber, fazia sorrindo, sem nunca reclamar. A prefeitura que não tinha um cantinho para o neto ficar e a filha trabalhar, recebia religiosamente o IPTU parcelado de Maria. A filha, que passava e lavava roupas para fora, sem máquina não lucrava muito, então Maria complementava a renda dela também.
Maria sucumbiu. Secou no pé quando uma doença nos pulmões a assolou em poucos meses.
Se foi. Descansou, a pobre!
Foi-se aquela Maria qualquer, que ao ir-se, faltou na mesa a comida da filha, a casa também, já que o prefeito não viu mais a cor do IPTU. As crianças dos vizinhos perderam roupas sem Maria para consertar. As casas de família, nunca mais viram uma funcionária tão dedicada e honesta.
Ao redor do que foi Maria, tudo ficou desarmônico e carente por algum tempo, mas ela passou a ser Maria Aparecida Silva, a falecida, não mais uma Maria qualquer.

Fê Effen

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