A cidade dorme
São nove e vinte e cinco
Da manhã.
O sol corta as nuvens
Beija as janelas
Faz cessar as goteiras
Celulares tocam
Carros sonâmbulos nas ruas estreitas
Gente compra
Gente vende
Gente fala
Gente escuta
A cidade dorme.
Os políticos
Essa gente nossa aí
Que mendiga agora
Para nos fazer mendigar depois
Com seus projetos
Caçando algum espaço
Ainda não apunhalado
Nas nossas pobres costas
Essa gente da gente aí
Servos do Deus vivo
Honrados
Inimigos dos bandidos
(bandidos também votam)
Fiéis e honrados
(prostitutas também votam)
Todo mundo vota
Nós votamos
Somos -naturalmente -
Obrigados.
Essa gente solidária
Vota.
E a cidade dorme
Sob o ruído dos sinais sonoros de ré
Alarmes de carro
Música péssima
Jingles de campanha
E orações preconceituosas
Como mandam as cartilhas.
Mãos estendidas
Clamam pelo genocídio nosso
De cada dia.
Gente de fé também vota.
Toda a gente vota
E não deveria.
E a cidade dorme
O país dorme
As siderúrgicas
As montadoras
As bancas de trecos do Paraguai
Muambeiro adormecido
Soldados roncando
As fronteiras cochilam
A lei ressona
A ordem permanece.
E a cidade dorme
Sob o afago das armas
Refém da crise iminente
Bolinada pelos seus cuidadores
Ainda finge que não é um pesadelo.
Claudinei Soares
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